O OVO DA SERPENTE
“Ovo da
serpente” filme de Ingmar Bergman, de 1977, se passa em Berlim, novembro de
1923, representa acontecimentos econômicos e sociais que pavimentaram a plena
ascensão do nazismo. Por analogia com a serpente, suas causas trazem mortes e destruições.
A chocadeira ocorre com profunda depressão, crise econômica, inflação, alta
taxa de desemprego, insegurança, instabilidade sócio-política-ética e moral.
Essas distorções na Alemanha levaram ao conflito mundial de 1938 a 1945, com
milhões de mortos, feridos e mutilados. O nazifascismo produz líder
autoritário, propaganda enganosa, isola a massa do mundo real, conduz ao
imaginário, explora o analfabetismo político (pessoas que não participam, não
discutem, não falam, nem entendem e odeiam políticos e a política em geral, pois
consideram todos corruptos e inimigos). Confiam e entregam todas as iniciativas
e soluções a um líder autoritário, um “salvador da pátria”, um oportunista de
ocasião. No Brasil esse quadro se agrava com milhares de mortos e infectados por
uma pandemia estimulada por líder autoritário que ocupa presidência da
República. Síntese: Os ingredientes para a serpente chocar seus ovos estão
claramente colocados. Resta a oposição, dessa vez, agir e impedir que propague
seu veneno, que infelizmente não aconteceu na Alemanha
O CONCEITO
BOLSONARO. SEU SIGNIFICADO
No programa
TV247 entrevista com Léo Ao Quadrado (acho que o nome é esse) abordou como a
esquerda está enfrentando o fenômeno Bolsonaro. Na visão de Léo a esquerda está
totalmente equivocada. A esquerda perdeu
o “time” na forma de comunicação e enfrentamento à Bolsonaro e tbm aos neoliberais
porque insiste numa estratégia de argumento e discussão que se demonstra
errada. Bolsonaro segue uma estratégia política que tem base e público. A mesma
que elegeu Trump. É científica, se baseia na realidade e no sentimento de numeroso
público dominado pela desinformação, alienação, individualismo extremado,
antipolitica cultivada, revolta com a situação pessoal, que condena
arbitrariamente a política, o político em geral por desmandos e corrupção. São
os famigerados analfabetos políticos sem noção exata de quem é corrupto, onde
começa, quem promove, por que e qual o sentido dessas campanhas moralistas. Esse
público é racista, machista, absolutamente impregnado pelo ódio, por tudo que
sofre, mal informado, sem entender. Esse público, sem transparência e
visualização, ganhou espaço e voz com as novas tecnologias. Megas redes e plataformas
digitais capturaram os dados, perfis, que foram parar nas mãos da
extrema-direita. Aconteceu na eleição de Trump (EUA), derrotado por um acidente
de percurso (inédita e histórica participação do eleitor). Contavam, como de
fato ocorreu, com crescimento eleitoral e a judicialização e pressão política
dos Republicanos no frágil, desmoralizado e arcaico sistema eleitoral
norte-americano. No Brasil, o PT, a esquerda precisa refletir esse fenômeno
internacional, priorizar ações estabelecendo metas para 2022 (eleição que pode nos
devolver a esperança). Como enfrentar o fenômeno, estratégia que dá suporte a Bolsonaro
(a mesma de Trump) e tudo que representa, envolvendo corporações do capital, empresas
multinacionais e nacionais, com suas contradições nesse quadro (uns ganhando
outros perdendo). Empresário produtivo nacional voltado para o mercado, sem
emprego e renda, vai fechar. Empresário exportador incomodado com as provocações
bolsonaristas à China, nosso maior mercado consumidor. O mercado financeiro, as
novas tecnologias, a bolsa de valores (especulador e investidor de papéis) aparentemente
ganhando com a pandemia, que os favorece, na compra pela internet e no endividamento
do Estado e contribuinte, com o crescimento da dívida pública ao adquirir título
desvalorizados e ganhar na venda. Na passagem do ano de 2020, Ernesto Araújo e
Bolsonaro, deram a “dica” dos inimigos bolsonaristas, listando 13, são eles: 1)
grande mídia, 2) narco-socialismo, 3) corrupção, 4) bandidagem em geral, 5)
sistema intelectual politicamente correto, 6) climatismo, 7) racialismo, 8)
covidismo, 9) terrorismo, 10) multilateralismo antinacional, 11) abortismo, 12)
ideologia de gênero, 13) trans-humanismo. Importante frisar que em qualquer
desses campos de discussão a esquerda ao tentar aprofundar o debate vai perder
tempo (que não dispõe) e uma tarefa complexa, pois seu gado está fechado,
desinformado, impregnado de ódio e temos prazo, 2022. Não se trata de fugir do
debate, mas estratégia para conquistar ou reduzir parte de seu rebanho. Aborto,
por exemplo, é uma discussão complexa, carregada de preconceito, impregnada na
maioria religiosa da população. Veja no discurso dos bolsonaristas sua
complexidade nesse tema, após a descriminalização do aborto na Argentina: Damares “Agradeço a Deus por nosso país
ser majoritariamente pró-vida”, Ernesto
Araújo “O Brasil permanecerá na vanguarda do direito à vida e na defesa dos
indefesos, não importa quantos países legalizem a barbárie do aborto indiscriminado”,
Bolsonaro “No que depender de mim e
do meu governo, o aborto jamais será aprovado em nosso solo”. Levar essa ou
outra discussão para um público preconceituoso, conservador, religioso é
desgastante, toma tempo e resultado eleitoral pífio. Nosso público, eleitorado,
ativista, militante, está a favor do aborto e outras iniciativas liberalizantes.
A estratégia do PT, esquerda, oposição é
mudar o eixo dessa discussão, ir para outro campo que eles não tem como
responder, não dominam, não enganam (evitar os treze citados por Ernesto Araújo).
Tocar onde todos estão sendo atingidos, na barriga: a economia, falta de renda, fome, falta de ocupação. Esse campo de
argumento tbm atinge empresário, pois sem mercado de consumo, sem emprego e se
atritando com a China vão à bancarrota. Não precisa citar Lula. Não precisa
xingar Bolsonaro. Vão concluir, lembrar que no governo Lula o mercado cresceu,
com emprego e renda. O Brasil chegou a 6ª potência mundial e está na 12ª
posição. A importância da Petrobras, do pré-sal não é para quem tem carro na
gasolina, mas na energia presente no custo de vida, na inflação, nos alimentos.
Os mais intelectualizados e informados da classe média distantes desse rebanho bolsonarista
pode chegar à militantes próximos, formadores de opinião e repassar os
argumentos estratégicos. Bolsonaro é um mentiroso contumaz, nunca foi
evangélico, a esposa abortou, corrupto, ligado ao crime organizado, antidemocrático,
terrorista, torturador, mas mantém um rebanho desinformado e do ódio. A
esquerda precisa fazer teste de paciência revolucionária, enfrentar a estupidez
descolada da realidade por fake news e internet. Discutir costumes tem mais complexidade,
renda e emprego não. Cada militante do PT e da esquerda se torna enfermeiro,
aplica a vacina contra o vírus do fake news, ajuda na reflexão, na
inteligência, imuniza. Esquerda e PT cometeram e vão continuar cometendo
equívocos, mas terá sempre de superar, tirar lições, corrigir. Esquerda é a
única esperança de mudanças para o país e o povo. Tirar lição do passado onde
Getúlio se suicidou, Jango se exilou, mas PT e Lula resistiram, não recuaram
frente ao inimigo. O PT não é PTB, é mais forte e organizado. Portanto, houve avanço.
A esquerda, principalmente o petista, precisa fazer rápida reciclagem, recuperar
energia, mudar, confundir o inimigo com tática e estratégia nova. Jamais
subestimar o inimigo, conhece-lo bem, não perder o foco. Bolsonaro tem suporte de
uma inteligência cientifica e tecnológica, repete o que mandam. Em 2022, está
prevista uma batalha, é preciso se preparar desde já, levar o inimigo para o
terreno propício de guerra, onde está exposto. No debate sobre aborto e outros de costumes evitar a armadilha.
Certa inverdade é mais difícil e demorada de reverter, falam de tirar a vida,
desinformam os ausentes da realidade. A esquerda e oposição precisa chegar no
terreno inimigo com paciência, política e diplomacia. Questionar onde não há
resposta: emprego, renda, alimentação,
saúde, violência, educação, moradia, leis sociais, trabalhistas e aposentadoria
retiradas. Nesse campo o PT e Lula no poder “bombaram”. Simples assim. O discurso do ódio está
colocado e é explorado por Bolsonaro (não é ele, mas importado), seu rebanho
foi cientificamente selecionado. Esse sentimento de ódio impede, trava a compreensão.
Até a vacina causa atrito, mas a realidade vai se impor. Sintetizando:
discutir e refletir sobre o mais óbvio. Antonio Negrão de Sá